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Preciso de um break

Foto do escritor: Pedro RodriguesPedro Rodrigues

Alguns dos leitores irão notar um certo brilho nos olhos ao começar a ler este texto. Provavelmente outros, devido à presença daquele pretenso arco-íris, poderão pensar que o lobbie da comunidade LGBTQIA+ chegou às consolas. Mas o que se trata é que a fotografia em questão alude a um ZX Spectrum de 1982! Precisamente dois anos depois do diagnóstico de autismo ter entrado na DSM III em 1980.


E porquê esta questão de interligar o ZX Spectrum e o autismo, perguntam-se alguns de vocês? Alguns leitores mais atentos já terão encontrado alguma associação entre o uso problemático da internet e as perturbações do neurodesenvolvimento (i.e., Perturbação de Hiperactividade e Défice de Atenção - PHDA, Perturbação do Espectro do Autismo - PEA). Inclusive, já terão lido algumas inferências das próprias perturbações em questão terem uma ligação directa com a utilização desadequada dos ecrãs.


E porquê, perguntam vocês? Pelo menos em alguns destes estudos, aquilo que alguns dos investigadores fizeram foi pedir para pessoas (i.e., crianças e jovens com um diagnóstico de perturbação do neurodesenvolvimento) preenchessem questionários de auto-relato sobre o seu comportamento de utilização de ecrãs. Alguns inclusive pedirão aos pais/cuidadores que informassem acerca da utilização destes equipamentos por parte dos seus filhos. E como verificaram que havia uma percentagem superior de utilização destes ecrãs por parte destes grupos em comparação com grupos normativos de controlo, inferiram que as pessoas com estes diagnósticos apresentam uma maior propensão e risco para o desenvolvimento desta outra perturbação – Perturbação de Adição à Internet.


Mas tal como diz no título, precisamos de um break, um break space! Ou seja, não precisamos de partir nada, isto se atendermos a uma tradução directa. Mas precisamos de pausar. E precisamos de pausar para pensarmos todos de forma mais coerente em relação a este assunto.


É plausível pensarmos que as pessoas com um diagnóstico de PEA e/ou uma PHDA possam representar um risco para desenvolverem mais comportamentos problemáticos relacionados com o uso dos ecrãs.


Por exemplo, no caso das crianças e jovens, mas também adultos com diagnóstico de PEA, o facto de poderem apresentar níveis de maior isolamento social face aos pares poderão perceber que a utilização dos ecrãs lhe permite um contacto e experiências de lazer com os pares, mas de uma forma mais protegida e anónima, e que lhes forneça uma sensação de pertença. Além disso, algumas destas pessoas poderão sentir dificuldades relacionadas com as competências académicas ou poderão ter algumas outras questões que lhes possam causar dificuldades nos resultados académicos. E que a utilização dos ecrãs, e mais especificamente alguns videojogos possam ajudar a suprimir essa mesma sensação de falta percepcionada de competência. Ou então, nas pessoas com diagnóstico de PHDA, verificamos que os compromissos neurobiológicos nos circuitos neuronais dopaminérgicos, irão levar a uma mais necessidade de continuar a jogar para suprimirem as suas necessidades. Ou então, sentirem uma maior dificuldade na inibição dos seus comportamentos, neste caso de pararem de jogar, assim como sentem em outros contextos (i.e., escola, família, etc.), e que tantas dificuldades na relação com os outros lhes traz.


Tendo em conta estes exemplos, parece importante que os pais e educadores possam introduzir as tecnologias na vida das crianças com diagnóstico de PEA e PHDA de forma adequada, precisamente para não potenciarem um conjunto de experiências precoces que venham a desenvolver crenças mais desadequadas, quer em relação ao seu comportamento de jogar, mas também em relação a si próprios. Mas na verdade isso também é verdade para as crianças sem nenhum diagnóstico. Ou seja, não existem diferenças nos cuidados a ter na introdução dos ecrãs no quotidiano das crianças, sendo que as recomendações universais em relação às idades e ao tempo de exposição, assim como à necessidade de supervisão, se mantêm iguais para ambos os grupos. E para além disso, poder ainda acrescentar que para as pessoas com um diagnóstico de PEA E PHDA, assim como para qualquer outra criança, o comportamento de jogar de uma forma saudável tem mais valias e ganhos de competências a vários níveis (i.e., cognitivo, emocional, motor, etc.) e que vale a pena considerar!

 

Pedro Rodrigues, psicólogo clínico do NICO e do Núcleo de Perturbações do Espectro do Autismo da PIN – Partners in Neuroscience (pedro.rodrigues@pin.com.pt)


 
 
 

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