Será que hoje em dia apostamos mais na nossa saúde mental?
- Joana Semedo Santos
- 22 de mai. de 2024
- 3 min de leitura
Comecemos com um desafio: destas duas imagens apresentadas em qual apostaria corresponder a um jogador a dinheiro?
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Provavelmente a primeira, assim como a maioria dos leitores (se não acertei e defraudei as suas expetativas, sinta-se à vontade em não ler o resto do texto, se a sua curiosidade o permitir, claro!).
As apostas e o mundo das apostas desportivas não são um tema apenas nos dias de hoje, nem deste século, contudo é verdade que têm existido alterações, desde o perfil do jogador (género, idade, estatuto sócio económico), ao ambiente e ao contexto em que se joga (online vs offline), até às crenças e ideologias acerca do jogo a dinheiro.
Ora, as questões que se impõem são: 1) será que hoje em dia estas alterações fazem com que esta problemática seja mais preocupante?; 2) Será que as pessoas têm noção de que jogar a dinheiro poderá ter uma componente aditiva?; 3) E se sim será que recorrem à ajuda? Convido-o a refletir comigo sobre este assunto.
O perfil de jogador a dinheiro, de que tínhamos ideia ser um homem de meia idade, com uma condição sócio económica favorável, e que utilizava o jogo como escape da realidade, e que, por norma, contraia dívidas e tinha problemas familiares e relacionais, já foi ultrapassado. Adolescentes, jovens, adultos, mulheres e até idosos jogam e apostam a dinheiro, pois as opções são muito variadas e de fácil utilização, desde aplicações online, a casinos e a raspadinhas. E a verdade é que grande percentagem dessa população joga de forma saudável e regulada.
Por outro lado, as crenças e ideologias de que não é um “problema”, não causa “adição”, quando comparado com casinos ou outro tipo de jogos a dinheiro, faz com que a pessoa não esteja consciente do perigo aditivo, em específico das apostas. Também o contexto social, em que muitas vezes se joga e aposta, entre amigos; entre família, muitas vezes é até o pai que vai apostar com o filho, e lhe transmite esse gosto e interesse. Depois, sobretudo, as apostas desportivas sobre futebol que permitem associar o gosto e interesse pelo futebol com apostar, sem ser necessário esforço ou sacrifício, sendo até fonte de prazer e satisfação.
Normalmente o processo começa de forma semelhante, entre amigos, começam a falar sobre o jogo que vai dar esta semana na Liga Europa/Champions/Campeonato de Portugal, e apostam até em género de brincadeira, instalam a aplicação (uma de muitas Betclic, Placard, etc.), começam a acompanhar as odds, falam sobre os resultados e o processo vai-se instalando.
Porém, se estivermos a falar de uma pessoa com baixa auto-estima, que considera que não tem tido sucesso em várias áreas da sua vida, e que encontra nas apostas, um sentimento de competência e autoeficácia, pois ganha dinheiro fácil e rápido, e ainda é reforçado pelos amigos quando ganha. Ora, o leitor poderá prever comigo que esta mesma pessoa vai começar a apostar mais vezes, e a colocar mais dinheiro no jogo, e em mais do que um jogo, e mais do que uma vez por dia. E começa a alterar a sua rotina diária, e já pára na papelaria antes de ir trabalhar, e durante o dia de trabalho vai por diversas vezes à aplicação Betclic e aposta, e por vezes, começa a perder. E vai apostando uma quantidade maior e a perder uma quantidade maior.
Muitas vezes há ainda a questão de a pessoa querer compensar o dinheiro perdido, por outro lado, também não vai partilhar com os mesmos amigos, porque era a única parte da sua vida em que tinha sucesso e agora está a falhar. E começa a existir em vez de um sentimento de prazer, satisfação e competência, sentimentos de frustração, ansiedade, tristeza, e até isolamento, vergonha, culpa.
O problema é que a pessoa quando chega a este ponto da situação, muitas vezes, ainda não recorre a ajuda, caso o procure em algum timing, e começa a apostar ainda mais, e passa a apostar em outros desportos além do futebol, e começa a aperceber-se das diversas armadilhas do mundo das odds, e, ao contrário do que a pessoa julgava, começa a perceber que não tem controlo sobre o jogo. E muitas vezes sim, só quando existem consequências financeiras, familiares, sociais, perda de trabalho, é que os amigos/ família ou, mais raro, a própria pessoa pede ajuda.
Seria então importante perceber alguns sinais de alerta, quer para o próprio, quer para família e amigos, e o que podem estas mesmas pessoas fazer para o ajudar!
Prometo em um próximo texto escrever sobre isso! Entretanto, se quiser ir lendo mais sobre o tema, poderá consultar aqui no site. Se se enquadrar fortemente com muita informação descrita neste texto ou se pontuar no questionário inicial uma avaliação preocupante, por favor, não hesite em contactar a nossa Equipa!
Até breve!
A Psicóloga Clínica e da Saúde, Joana Semedo Santos (CP OPP 24513)
PIN – Partners in Neuroscience
Núcleo de Intervenção no Comportamento Online
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